26 julho, 2012

Para esquecer


estou há dias adiando esquecer uma história, enterrá-la, mudar de assunto, mas não sem lamentar a decisão de esquecer. quando penso que quase, bem quase dentro de mim toda já está tudo pronto para que isso aconteça, a história volta sozinha, sem que eu a chame, busque ou a amarre aos meus pés. então fico mais um pouco até começar a deixá-la ir embora outra vez. a vida, às vezes, nos desorienta demais. não há pergunta nem resposta que baste nessa hora, só uma falta de sossego sem precedentes. eu quero esquecer porque não quero que doa lá na frente ou logo mais. quero esquecer porque desconfio de seu vazio e me sinto tola. mas é difícil sepultar uma dúvida quando nesta contém desejo, é difícil esperar a semana que vem e depois a outra e o tempo que, sozinho, transforma tudo em passado. é doloroso suspeitar que algo que gostaríamos imensamente de possuir e viver, talvez não seja pra gente, não possa em tempo algum levar nosso nome. é um querer cego e sem sentido aparente, mas tão prazeroso de sentir que dá pena deixar pra lá logo de uma vez pra nunca mais. e então, vamos adiando. pois quando decidimos finalmente esquecer, parece que perdemos algo, um pedaço fica solto no mundo, sem dono e sem proteção e, dependendo da situação, ficamos pensando por um longo tempo como essa parte deixada estaria se ainda estivesse por perto nos aquecendo mesmo que apenas em pensamento. é de enlouquecer esse negócio de desistir sem ter certeza absoluta. dá medo e dá saudade antecipada. isso que estou escrevendo não é propriamente um texto literário como são todos os outros deste blog que vos fala, mas, sim, um desabafo, real e sincero, de alguém – que sou eu, que espera pra mudar de idéia e deixar tudo por conta do esquecimento, mas não consegue


"Quem é feliz não conta, não espalha, não grita aos quatro cantos. Quem é feliz, satisfaze-se por ser. E sabe que felicidade anda coladinha na inveja. Quem é feliz não precisa provar nada, simplesmente é. As pessoas felizes demais nunca me passaram confiança. Essa coisa de que a vida é uma festa e não existe nada errado, não me brilha aos olhos. Feliz é quem conhece o lado ruim e o respeita. Feliz é quem já foi infeliz. Somente quem já foi infeliz pode entender que a tristeza traz um punhado muito bom de aprendizados. Felicidade não é sobre quem grita mais alto; é sobre quem sorri mais fundo."

Clarissa Corrêa

12 junho, 2012

Feliz dia dos namorados! =)


Colheita

Eu procurava o amor em jardins de cactus. 
Vinha buscando o fruto em árvores erradas, e nas mordidas sentia o gosto azedo, que amarga no fim da boca. 
Colhi amores podres, comidos pelo tempo e dor.
Foi preciso paciência – e um outro tempo – amadurecendo um fruto para colhê-lo doce, suave, terno e delicado.
Simples como naturalmente é.
Eu imaginava haver segredos por trás dos espinhos. 
Mas é puro acaso que amores e espinhos se encontrem em botões abertos ou fechados. 
A rima entre amor e dor é armadilha.
O verdadeiro fruto está ao alcance das mãos – mas é tão rasteiro, que quase não se vê. 
É preciso passear sem fome para enxergá-lo redondo, vermelho. 
Para então mordê-lo distraído como numa tarde de chuva

(Cris Guerra)

22 fevereiro, 2012


"Se você não se atrasar demais, posso te esperar por toda a minha vida"

Oscar Wilde

14 fevereiro, 2012

O amor acaba

O amor acaba. Numa esquina, por exemplo, num domingo de lua nova, depois de teatro e silêncio; acaba em cafés engordurados, diferentes dos parques de ouro onde começou a pulsar; de repente, ao meio do cigarro que ele atira de raiva contra um automóvel ou que ela esmaga no cinzeiro repleto, polvilhando de cinzas o escarlate das unhas; na acidez da aurora tropical, depois duma noite votada à alegria póstuma, que não veio; e acaba o amor no desenlace das mãos no cinema, como tentáculos saciados, e elas se movimentam no escuro como dois polvos de solidão; como se as mãos soubessem antes que o amor tinha acabado; na insônia dos braços luminosos do relógio; e acaba o amor nas sorveterias diante do colorido iceberg, entre frisos de alumínio e espelhos monótonos; e no olhar do cavaleiro errante que passou pela pensão; às vezes acaba o amor nos braços torturados de Jesus, filho crucificado de todas as mulheres; mecanicamente, no elevador, como se lhe faltasse energia; no andar diferente da irmã dentro de casa o amor pode acabar; na epifania da pretensão ridícula dos bigodes; nas ligas, nas cintas, nos brincos e nas silabadas femininas; quando a alma se habitua às províncias empoeiradas da Ásia, onde o amor pode ser outra coisa, o amor pode acabar; na compulsão da simplicidade simplesmente; no sábado, depois de três goles mornos de gim à beira da piscina; no filho tantas vezes semeado, às vezes vingado por alguns dias, mas que não floresceu, abrindo parágrafos de ódio inexplicável entre o pólen e o gineceu de duas flores; em apartamentos refrigerados, atapetados, aturdidos de delicadezas, onde há mais encanto que desejo; e o amor acaba na poeira que vertem os crepúsculos, caindo imperceptível no beijo de ir e vir; em salas esmaltadas com sangue, suor e desespero; nos roteiros do tédio para o tédio, na barca, no trem, no ônibus, ida e volta de nada para nada; em cavernas de sala e quarto conjugados o amor se eriça e acaba; no inferno o amor não começa; na usura o amor se dissolve; em Brasília o amor pode virar pó; no Rio, frivolidade; em Belo Horizonte, remorso; em São Paulo, dinheiro; uma carta que chegou depois, o amor acaba; uma carta que chegou antes, e o amor acaba; na descontrolada fantasia da libido; às vezes acaba na mesma música que começou, com o mesmo drinque, diante dos mesmos cisnes; e muitas vezes acaba em ouro e diamante, dispersado entre astros; e acaba nas encruzilhadas de Paris, Londres, Nova York; no coração que se dilata e quebra, e o médico sentencia imprestável para o amor; e acaba no longo périplo, tocando em todos os portos, até se desfazer em mares gelados; e acaba depois que se viu a bruma que veste o mundo; na janela que se abre, na janela que se fecha; às vezes não acaba e é simplesmente esquecido como um espelho de bolsa, que continua reverberando sem razão até que alguém, humilde, o carregue consigo; às vezes o amor acaba como se fora melhor nunca ter existido; mas pode acabar com doçura e esperança; uma palavra, muda ou articulada, e acaba o amor; na verdade; o álcool; de manhã, de tarde, de noite; na floração excessiva da primavera; no abuso do verão; na dissonância do outono; no conforto do inverno; em todos os lugares o amor acaba; a qualquer hora o amor acaba; por qualquer motivo o amor acaba; para recomeçar em todos os lugares e a qualquer minuto o amor acaba.


O Amor Acaba - Crônicas Líricas e Existenciais

27 janeiro, 2012

A voz do silêncio - Marta Medeiros

Pior do que a voz que cala,
é um silêncio que fala.

Simples, rápido! E quanta força!

Imediatamente me veio à cabeça situações
em que o silêncio me disse verdades terríveis,
pois você sabe, o silêncio não é dado a amenidades.
Um telefone mudo. Um e-mail que não chega.
Um encontro onde nenhum dos dois abre a boca.

Silêncios que falam sobre desinteresse,
esquecimento, recusas.

Quantas coisas são ditas na quietude,
depois de uma discussão.
O perdão não vem, nem um beijo,
nem uma gargalhada
para acabar com o clima de tensão.

Só ele permanece imutável,
o silêncio, a ante-sala do fim.

É mil vezes preferível uma voz que diga coisas
que a gente não quer ouvir,
pois ao menos as palavras que são ditas
indicam uma tentativa de entendimento.

Cordas vocais em funcionamento
articulam argumentos,
expõem suas queixas, jogam limpo.
Já o silêncio arquiteta planos
que não são compartilhados.
Quando nada é dito, nada fica combinado.

Quantas vezes, numa discussão histérica,
ouvimos um dos dois gritar:
"Diz alguma coisa, mas não fica
aí parado me olhando!"

É o silêncio de um, mandando más notícias
para o desespero do outro.

É claro que há muitas situações
em que o silêncio é bem-vindo.
Para um cara que trabalha
com uma britadeira na rua,
o silêncio é um bálsamo.
Para a professora de uma creche,
o silêncio é um presente.
Para os seguranças de um show de rock,
o silêncio é um sonho.

Mesmo no amor,
quando a relação é sólida e madura,
o silêncio a dois não incomoda,
pois é o silêncio da paz.

O único silêncio que perturba,
é aquele que fala.

E fala alto.

É quando ninguém bate à nossa porta,
não há emails na caixa de entrada
não há recados na secretária eletrônica
e mesmo assim, você entende a mensagem.

19 janeiro, 2012



“Ela olha para ela em vez de olhar para ti, e por isso não te conhece.Durante as duas ou três pequenas explosões de paixão que ela se permitiu a teu favor, ela, por um grande esforço de imaginação, viu em ti o herói dos seus sonhos, e não tu mesmo como realmente és.” (diz o príncipe Korasoff a Julien Sorel, sobre a sua amada)
(“O Vermelho e o Negro”, de Stendhal, sec. XVIII-XIX).

17 janeiro, 2012

Cinco sentidos - Domenico

Olha o céu

Não sei dizer se a chuva traz você

Ou se é só o vento que atravessa meu pensamento

E aqui me deixa sem encontrar o meu caminho de voltar

Sai o sol, o dia vem

Eu não penso em mais ninguém

Meus cinco sentidos só me deixam mais sozinho

Tudo que fazem é me lembrar que estou distante de você